Vara da Infância e da Juventude do Foro Regional da Lapa-SP
Processo nº: Adoção Nacional (art. 39 A 52, L.8069/90)
Requerente:
Juiz de Direito: Dr. Reinaldo Cintra Torres de Carvalho
Vistos.
G qualificada na inicial, ajuizou pedido de Adoção Unilateral das crianças A e
M, filhas de E, que subscreveu a inicial concordando expressamente com o pedido
formulado. A autora e a mãe das crianças vivem em união homoafetiva estável há 12
anos, conforme documento que juntaram, se apresentando familiar e socialmente como
se casadas fossem. Por se tratar de relação homoafetiva, impossível gerarem filhos
comuns, razão pela qual E optou por gerar as duas filhas através de inseminação
artificial, tudo de comum acordo com a autora G. Assim, genitora e adotante cuidam do
bem estar das crianças desde o nascimento, devotando o melhor de si para o bem estar e
crescimento sadio das infantes. G, desde o primeiro momento, tem como suas filhas A e
M. As crianças se referem às duas como "mãe", indistintamente. A adoção de fato já se
consumou, restando apenas a sua legalização, com o reconhecimento da constituição de
uma entidade familiar, onde adotante e genitora devem dividir o poder familiar sobre as
crianças. A adoção vai de encontro aos interesses das infantes, uma vez que passarão a
ter direitos de filha em relação a G, e esta, obrigações de mãe. Pediu a procedência da
ação e a concessão da adoção pleiteada. Juntou os documentos de fls. 27/117.
Manifestação do Ministério Público a fls. 119/125, acompanhada do documento
de fls. 126, onde opina pelo processamento do pedido.
Avaliações técnicas a fls. 131/138 (psicológica) e 140/148 (social).
Genitora ouvida conforme termo de fls. 154, onde expressamente concorda com
o pedido formulado por G.
Parecer do Ministério Público a fls. 156/162, onde opina pela procedência da
ação.
É o relatório.
DECIDO.
Trata-se de pedido de adoção unilateral, onde as crianças a serem adotadas não
possuem filiação paterna, e a genitora concorda expressamente com o pedido
formulado.
Assim, inexistindo contestação ao pedido, deve ele ser apreciado apenas quanto
à sua legalidade e conveniência para as infantes.
Desnecessária a produção de outras provas, uma vez que o pedido se encontra
devidamente instruído, tendo havido estudos psicossociais a respeito da conveniência ou
não da adoção.
O feito deve, portanto, ser julgado nos termos do disposto pelo artigo 330, inciso
I, do Código de Processo Civil.
O pedido posto sob apreciação do juízo é de complexa natureza, pois se pretende
a concessão da adoção unilateral de duas crianças para a companheira da genitora,
implicando esta decisão no reconhecimento, ou não, da possibilidade jurídica de união
estável entre pessoas do mesmo sexo, ou seja, a existência de união homoafetiva dentro
do mundo jurídico.
Não desconhece o julgador que o reconhecimento da união homoafetiva ainda é
tabu em nossa sociedade, sendo, qualquer posição que se adote, questionada em sua
essência.
Ainda é objeto de grandes discussões pelas diversas áreas do saber, a simples
definição do que seja "família" e qual a sua essência.
A aceitação pelo mundo legal e pela sociedade de que não pode mais haver
distinção entre a filiação biológica e a adotiva, derruba a idéia de que a "família" só
existe em decorrência dos laços sanguíneos.
Da mesma forma, a aceitação em relação à existência de família monoparental
deixa assente que a ausência da figura paterna ou materna não descaracteriza o grupo
como "família" e não impede o sadio desenvolvimento da prole cuidada apenas pelo pai
ou pela mãe.
Mesmo a ausência do pai e da mãe não descaracteriza o grupo formado pelos
infantes e adultos cuidadores como sendo "família" (avós que cuidam de netos, tios que
cuidam de sobrinhos, padrinhos que cuidam de afilhados, etc).
Casais que se separam e se unem com outras pessoas, às vezes reunindo os filhos
de um, do outro, gerando, ou não, filhos comuns, são reconhecidos como "família".
Filhos de pais separados acabam por ter duas "famílias" quando seus genitores se
unem a outras pessoas – a "família" do pai e a "família" da mãe. Entendo não se adequar
à realidade a afirmação de que esse filho pertença apenas à "família" daquele que
detenha a sua guarda.
O que torna comum a idéia de que essa diversidade de formas de se constituir
seja considerada como "família", se o sangue não é fundamental, a figura masculina
e/ou feminina podem estar ausentes, e se uma mesma pessoa pode pertencer a dois
grupos distintos que se denominam "família"?
A resposta que se tem aceito, é a de que a "família" se constitui pela formação de
laços afetivos pela convivência duradoura, pública e contínua; pela lealdade entre seus
componentes; pelo respeito; pela disponibilidade para a assistência por e para cada um
de seus componentes; e pela busca da felicidade comum.
Para se ter uma "família", não se faz necessário que exista atividade sexual entre
alguns de seus componentes (homem e mulher – famílias monoparentais) e capacidade
de procriar (pessoas estéreis ou inférteis).
O que gera uma "família" são os laços de afeto e respeito que unem seus
componentes.
Assim, uma "família" composta por pessoas do mesmo sexo, que possuem laços
afetivos consolidados, que se assistem, que são leais e se respeitam mutuamente, que
possuem convivência duradoura, pública e constante, difere de uma "família" composta
por pessoas de sexos diferentes apenas pela sua incapacidade de gerar filhos comuns
pela atividade sexual praticada entre eles.
Se o procriar não se inclui, necessariamente, como elemento constitutivo da
"família", não se pode, pelo menos à luz da razão, excluir a união homoafetiva como
forma de se constituir uma "família".
Problemas semelhantes aos enfrentados pelos casais homoafetivos foram
enfrentados pelas pessoas que se separavam de seus cônjuges e se uniam a outras
pessoas, ou que simplesmente não queriam se casar, mesmo sendo solteiras. Como só se
reconhecia o casamento como forma de se constituir nova "família", e havia o
impedimento legal de um novo casamento antes do advento da Lei do Divórcio, essas
uniões eram consideradas espúrias e não conferiam qualquer direito àqueles que
passavam a "viver como se casados fossem", sendo que seus filhos, durante muito
tempo, não possuíam os mesmos direitos daqueles gerados na constância do casamento.
Num primeiro momento, a sociedade passou a não discriminar essas relações,
depois a jurisprudência, timidamente, passou a entender que essa união se equiparava a
uma "sociedade de fato", conferindo alguns direitos aos conviventes e, posteriormente, a
Constituição Federal de 1988 reconheceu esta como forma de composição de uma
"entidade familiar".
No caso da união homoafetiva, temos que, apesar dos avanços obtidos pela atual
Constituição Federal, a "entidade familiar" só recebeu reconhecimento sob a forma do
casamento, da união estável entre homem e mulher ou quando constituída por
ascendentes e descendentes.
A união homoafetiva, portanto, não foi reconhecida como forma de ser
constituída a "entidade familiar".
Grande oportunidade perdida pelos nossos constituintes.
Da mesma forma, a atual Lei de Adoção, promulgada em 03 de agosto de 2009,
viu retirada de seu texto original (talvez o único comando legal que avançava em
matéria de adoção), a possibilidade de se realizar a adoção por casal homoafetivo.
Assim, o pedido inicial careceria de fundamento em expresso texto legal, seja
constitucional, seja por legislação ordinária.
Ocorre, porém, que a realidade não pode ser esquecida pelo julgador quando do
exercício de seu ofício.
A opção homossexual e a união homoafetiva são realidades, contra as quais a
sociedade vem resistindo cada vez em menor intensidade.
Os estudos científicos na área da psicologia apontam para a direção de que a
opção sexual dos genitores (biológicos ou adotivos) não interfere na psique dos filhos,
equiparando-se em qualidade a paternidade/maternidade heterossexual e homossexual.
O que pode interferir frente à filiação, é o exercício não saudável da opção
sexual, e não a opção em si, seja ela homo ou heterossexual.
As próprias vozes que se levantam contra a aceitação da existência da "entidade
familiar" em decorrência da união homoafetiva, não possuem o mesmo calor em relação
à adoção por homossexual.
Isto porque, o grande bastião que se levanta contra a "união homoafetiva" é o
alegado impedimento legal.
Com relação à constituição de uma "entidade familiar" composta por apenas um
(01) homossexual e seu filho (seja biológico ou adotivo) – entidade monoparental, por
não existir o alegado impedimento legal, as vozes que bradam contra a união
homoafetiva se silenciam ou verberam em baixa intensidade.
Sem o alegado amparo legal, a contrariedade à existência da "entidade familiar"
decorrente da união homoafetiva estará lastreada em aspectos religiosos ou morais, pois
a ciência já não considera doença ou aberração a opção que não seja a heterossexual.
Não existindo qualquer impedimento legal à adoção por homossexual, esta
ocorre em número cada vez maior, não se tendo notícias de que essas "entidades
familiares" sejam menos exitosas do que aquelas realizadas por heterossexuais.
A impedir-se que o companheiro do adotante possa também adotar, se está a
estimular a hipocrisia, pois na vida real a adoção é feita pelo casal. O adotado será
criado em ambiente onde a união homoafetiva existe, e o companheiro homossexual
fará parte (de fato) da "entidade familiar" reconhecida legalmente.
Inexistindo estudos que desaconselhem, comprovadamente, a adoção por
homossexual e não havendo impedimento legal para que essa adoção seja concedida,
não encontra respaldo no mundo real a proibição para que casal homoafetivo adote.
O objetivo maior da adoção é garantir o direito da criança e adolescente à
convivência familiar, dando a ele uma "boa família", quando não possa viver sob os
cuidados de sua "família" biológica.
Pelo entendimento até aqui exposto, não vejo, sob o ponto de vista lógico, razão
para não aceitar a adoção por pretendentes em união homoafetiva.
Vejamos, agora, a possibilidade da adoção pleiteada, sob o ponto de vista
jurídico.
Quanto a isso, necessário anotar a importância do tema relativo à união
homoafetiva.
O C. Supremo Tribunal Federal, nos autos da Medida Cautelar na Ação Direta
de Inconstitucionalidade ADI 3300 MC/DF, em decisão monocrática do Ministro
CELSO DE MELLO, cuja ementa foi publicada no DJU de 09 de fevereiro de 2006,
deixou consignado que:
“EMENTA: União civil entre pessoas do mesmo sexo. Alta Relevância Social e
Jurídico-Constitucional da questão pertinente às uniões homoafetivas. Pretendida
qualificação de tais uniões como entidades familiares. Doutrina. Alegada
inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 9.278/96. Norma legal derrogada pela
superveniência do art. 1.723 do novo Código Civil (2002), que não foi objeto de
impugnação nesta sede de controle abstrato. Inviabilidade, por tal razão, da ação direta.
Impossibilidade jurídica, de outro lado, de se proceder à fiscalização normativa abstrata
de normas constitucionais originárias (CF, art. 226, §3º, no caso). Doutrina.
Jurisprudência (STF). NECESSIDADE, CONTUDO, DE SE DISCUTIR O TEMA
DAS UNIÕES ESTÁVEIS HOMOAFETIVAS, INCLUSIVE PARA EFEITO DE SUA
SUBSUNÇÃO AO CONCEITO DE ENTIDADE FAMILIAR. MATÉRIA A SER
VEICULADA EM SEDE DE ADPF.”
Em que pese se tratar de matéria pouco apreciada pelos Tribunais, a
jurisprudência em matéria de adoção por casal homossexual tem se encaminhado no
sentido da sua possibilidade.
Nesse sentido o paradigmático e v. acórdão proferido nos autos da Apelação
Civil nº 70013801592/2005, da 7ª Câmara Civil do E. Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul, relatado pelo insigne Desembargador LUIZ FELIPE
BRASIL SANTOS, pelo qual, com lastro nos princípios constitucionais da dignidade
da pessoa humana e da igualdade, utilizando-se da analogia e dos princípios gerais do
direito, aponta para a legalidade do reconhecimento da união homoafetiva como
"entidade familiar", por equiparação à união estável, e, por isso, possível a concessão da
adoção para duas pessoas do mesmo sexo.
Do mencionado aresto supra mencionado, podemos destacar os seguintes
trechos:
"... Não se está aqui a afirmar que tais relacionamentos [união homoafetiva]
constituem exatamente uma união estável. O que se sustenta é que, se é para tratar por
analogia, muito mais se assemelham a uma união estável do que a uma sociedade de
fato. Por que? Porque a affectio que leva estas duas pessoas a viverem juntas, a
partilharem os momentos bons e maus da vida é muito mais a affectio conjugalis do que
a affectio societatis. Elas não estão ali para obter resultados econômicos da relação,
mas, sim, para trocarem afeto, e esta troca de afeto, com o partilhamento de uma vida
em comum, é que forma uma entidade familiar. Pode-se dizer que não é união estável,
mas é uma entidade familiar à qual devem ser atribuídos iguais direitos.
Estamos hoje, como muito bem ensina Luiz Edson Fachin, na perspectiva da
família eudonista, ou seja, aquela que se justifica exclusivamente pela busca da
felicidade, da realização pessoal de seus indivíduos. E essa realização pessoal pode darse
dentro da heterossexualidade ou da homossexualidade. É uma questão de opção, ou
de determinismo, controvérsia esta acerca da qual a ciência ainda não chegou a uma
conclusão definitiva, mas, de qualquer forma, é uma decisão, e, como tal, deve ser
respeitada.
Parece inegável que o que leva estas pessoas a conviverem é o amor. São
relações de amor, cercadas, ainda, por preconceitos. Como tal, são aptas a servir de base
a entidades familiares equiparáveis, para os efeitos, à união estável entre homem e
mulher.”
No corpo do acórdão é citada doutrina de MARIA CELINA BODIN
MORAES (A união entre pessoas do mesmo sexo: uma análise sob a perspectiva civilconstitucional,
in RTDC, v.1, p. 89/112), sendo que dessa citação importar transcrever o
seguinte trecho:
“...
Seguindo-se estes raciocínios hermenêuticos, o da especificidade da
interpretação normativa civil à luz da Constituição, cumpre verificar se por que a norma
constitucional não previu outra formas de entidades familiares, estariam elas
automaticamente excluídas do ordenamento jurídico, sendo imprescindível, neste caso,
a via emendacional para garantir proteção jurídica às uniões civis entre pessoas do
mesmo sexo, ou se, ao contrário, tendo-se em vista a similitude das situações [união
estável e união homoafetiva], estariam essas uniões abrangidas pela expressão
constitucional “entidade familiar”.
...
A partir do reconhecimento da existência de pessoas definitivamente
homossexuais, ou homossexuais inatas, e do fato de que tal orientação ou tendência não
configura doença de qualquer espécie – a ser, portanto, curada e destinada a desaparecer
-, mas uma manifestação particular do ser humano, e considerado, ainda, o valor
jurídico do princípio fundamental da dignidade da pessoa, ao qual está definitivamente
vinculado todo o ordenamento jurídico, e da conseqüente vedação à discriminação em
virtude da orientação sexual, parece que as relações entre pessoas do mesmo sexo
devem merecer status semelhante às demais comunidades de afeto, podendo gerar
vínculo de natureza familiar”.
Aderindo às ponderações acima expostas, entendo ser possível a consideração da
união homoafetiva como sendo uma das formas de se constituir uma “entidade
familiar”, em respeito aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e
da igualdade.
A liberdade sexual é garantida pelo princípio da dignidade da pessoa humana, e
tratando-se de situações equiparadas pela analogia, deve ser garantido o princípio da
igualdade no tratamento de direitos e obrigações decorrentes da união estável e da união
homoafetiva.
Quanto a eventual questionamento que se possa fazer em relação a ser benéfico
às infantes a adoção pleiteada, entendo que o pedido inicial está apenas buscando a
tutela jurídica para regular situação de fato existente.
A requerente e a genitora das crianças vivem em união homoafetiva desde 29 de
maio de 1996, conforme escritura de declaração acostada a fls. 48/49, sendo certo que
as infantes reconhecem as duas como mãe.
Desde o nascimento de ambas, foram cuidadas, acarinhadas e educadas pela
genitora e requerente, como se filhas de ambas fossem.
Os documentos encartados aos autos noticiam que tanto requerente como
genitora dividem as tarefas de cuidar e educar, não havendo distinção junto a médicos,
dentistas ou professores de quem seria a mãe das crianças.
As famílias da requerente e da genitora reconhecem que elas vivem em união
homoafetiva, enxergam essa relação como verdadeira união estável, não possuem
qualquer restrição quanto a esse relacionamento, vendo verdadeira família constituída
entre elas.
Os estudos psicossociais são unânimes em afirmar que a adoção se constitui em
medida salutar para as meninas, sendo que dos estudos realizados pela Sra. Psicóloga
Judiciária podemos extrair os seguintes trechos:
“...
Estamos diante de uma genuína família, capaz de propiciar um sólido espaço de
pertinência a suas crianças, para se desenvolverem integralmente, construírem
profundos vínculos afetivos e se constituírem como verdadeiros sujeitos de suas
histórias de vida.
A constância e continuidade de cuidados, de amor e de afeto oferecidos por estas
senhoras, propicia a consolidação do sentimento de segurança e bem-estar, tão
fundamental ao adequado desenvolvimento do psiquismo infantil.
Lidando sempre com a verdade dos fatos, sem camuflar a realidade, a genitora e
a requerente, embasadas na sábia afirmação da psicanalista e estudiosa francesa
Françoise Dolto, “nunca é cedo demais para falar a verdade”, já estão realizando a
revelação da história de vida das meninas. Fator, essencial, para consolidar os
sentimentos de confiança das crianças em relação às mães.
Constatamos, também, que as irmãs A. e M. vêm recebendo um excelente
suporte social e emocional proporcionado pela saudável relação com os avós, tios,
demais pessoas da família extensa e pela rede de amigos de ambos os sexos.
...
A requerente Sra. G. vem acompanhando integral e amorosamente o
crescimento, a educação e o desenvolvimento de A. e M., oferecendo-lhes ótima
qualidade de maternagem, revelando, assim, que a função materna pode transcender os
laços biológicos.”
Conclui a Sra. Técnica o seu trabalho afirmando que:
“Um dos aspectos cruciais abordados durante nossa análise, prendeu-se à
indagação de como será a vivência destas crianças quando se defrontarem com o
preconceito, ainda tão presente em nossa sociedade. Percebemos, no entanto, que as
Sras. G. e E. apresentam amplos recursos simbólicos e aptidão no sentido de fortalecer
as filhas e bem instrumentalizá-las com o intuito de enfrentarem o preconceito.
Sra. G. demonstra significativa disponibilidade interior e habilidade no sentido
de maternar estas crianças, o que já vem realizando desde o nascimento das mesmas,
propiciando-lhes um ambiente doméstico seguro, educativo, criativo, estimulante e
afetivo.
Em face do acima exposto, acreditamos que a requerente Sra. G. apresenta
sólido preparo para ser atendida em seu pedido.” (fls. 137/138)
A Sra. Assistente Social, após minuciosa análise da estrutura familiar da
requerente e da genitora, a condição sócio-financeira das mesmas, e o relacionamento
com o mundo exterior, concluiu que:
“Observo que o relacionamento de 12 anos entre E. e G., se constitui de fato
como estável, equilibrado e permeado pelo respeito mútuo.
O convívio familiar é freqüente, amistoso e franco, onde todos se relacionam
como família, se ajudando e apoiando mutuamente, o que deu base para uma união
tranqüila e planejamento familiar equilibrado.
As crianças são tratadas com respeito, carinho e atenção, onde os valores
familiares são preservados. Existe estrutura sócio-econômica para a criação e educação
das duas crianças.
Tanto as partes como os familiares acordam que G. participa e acompanha todo
o desenvolvimento das meninas como mãe, assumindo cuidados e responsabilidades e
lhes dedicando amor maternal.
Nada há que se possa notar acerca de falta de estrutura familiar, social ou
financeira no trato de A. e M., bem como toda a construção desta estrutura se deve ao
trabalho e conquista de E. e G. juntas.
Trata-se de pessoas amadurecidas, conscientes e seguras tanto na vida como
acerca do significado e importância do presente pedido.
Assim, S.M.J., a nível sócio-econômico e da estrutura das relações sociais, nada
há que se possa opor à concessão da adoção unilateral de A. e M. pela requerente G.,
adoção esta já concretizada de fato.” (fls. 148)
O Ministério Público, em seu parecer, analisou profundamente a questão posta e,
lucidamente, opinou pela concessão da adoção, aduzindo que “o que mais se afigura
justo e próximo do ideal de alcance do superior interesse das crianças é justamente
ouvi-las – e ambas querem duas mães, já que se referem a ambas nesse sentido e
atribuem às duas esse papel, como já esboçado pela Assistente Social do Juízo”.
Resta seja analisada pelo juízo a questão relativa ao assento de nascimento das
adotandas, tendo em vista, pelo que se decide, terão elas duas mães.
A solução para tal impasse, se não ortodoxa, já foi apontada pela C. 7ª Câmara
Cível do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no v. acórdão supra
mencionado.
Do assento de nascimento das adotandas deverá constar que são filhas de E. e
G., netas dos genitores destas, sem que se decline a condição de pai ou mãe.
ISTO POSTO, e o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a
presente ação para conceder a adoção unilateral de A e M à requerente G, mantendo as
infantes os mesmos que possuem atualmente, devendo constar de seus assentos de
nascimento serem elas filhas de E e G (sem qualquer menção a pai ou mãe), e netas de P
e L e de G e I (sem qualquer menção a serem eles paternos ou maternos).
Expeça-se mandado para que o Sr. Oficial de Registro Civil das Pessoas
Naturais e Tabelião de Notas do º Subdistrito – , desta Capital, proceda a averbação da
adoção unilateral junto aos assentos de nascimento de A (fls. do Livro nº A-, sob nº ) e
M (fls. do Livro A-nº , sob nº ), conforme o determinado nesta decisão, mantidos, no
mais, as demais anotações existentes nos assentos.
Sem custas ou honorários.
Transitada esta em julgado, cumprido o mandado de averbação, e nada sendo
requerido pelas partes, arquivem-se os autos.
PRIC
São Paulo, 31 de julho de 2009.
Reinaldo Cintra Torres de Carvalho
Juiz de Direito